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Archive for August 2011

UTOPIA REAL

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Ao completar 50 anos de criação, o Parque Indígena do Xingu ainda oferece um porto seguro aos primeiros habitantes do Brasil.

POR FELIPE MILANEZ

Written by Felipe Milanez

August 31, 2011 at 10:05 pm

RURALISTAS VAIAM ANÚNCIO DE MORTE DE AMBIENTALISTA.

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O deputado federal Sarney Filho (PV-MA) é vaiado por ruralistas ao denunciar o assassinato do casal de ambientalistas José Cláudio Ribeiro da Silva e Maria do Espírito Santo, executados em Nova Ipixuna, região sudeste do Pará. Ele lê o trecho da reportagem de Felipe Milanez: Zé Cláudio e a Majestade.

Written by Felipe Milanez

August 31, 2011 at 8:27 pm

FUNERAL DE CASAL EXTRATIVISTA REÚNE MIL E FECHA ESTRADA

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POR FELIPE MILANEZ

DE MARABÁ (PA)

26 de maio de 2011 às 16:43h 

José Cláudio e dona Maria foram executados na quarta-feira 24, após denunciarem a atuação de grupos madeireiros. Familiares temem que a impunidade prevaleça. Foto Rodolfo Oliveira/AG. Pará

O cortejo fúnebre e o enterro dos líderes extrativistas José Cláudio Ribeiro da Silva e Maria do Espírito Santo da Silva, na manhã desta quinta-feira, em Marabá (PA), foi transformado em um grande ato público pela reforma agrária, que fechou uma rodovia e a Estrada de Ferro de Carajás por ao menos seis horas. Cerca de mil pessoas participaram do funeral do casal, executado a tiros na manhã da quarta-feira 24, em Nova Ipixuna, município a 390 quilômetros de Belém, a capital paraense.

O velório foi realizado na casa de um irmão de José Claudio, num espaço que, em dias comuns, funciona um bar. De lá, centenas de pessoas percorreram um trajeto com pouco mais de 6 quilômetros até o Cemitério da Saudade, em Marabá, a quarta cidade mais violenta do Brasil, com taxa de 125 homicídios para cada 100 mil habitantes, segundo o “Mapa da Violência 2011”. O grupo parou a rodovia PA 150, a mesma que, a quilômetros dali, foi palco da morte de 19 trabalhadores sem-terra em 1996, no episódio que ficou conhecido como Massacre de Eldorado dos Carajás. O cortejo também passou pela ponte sobre o rio Tocantins, onde, em 1986, nove garimpeiros foram mortos pela Polícia Militar.

Sob sol forte, algumas pessoas passaram mal e uma senhora chegou a desmaiar. Em meio às manifestações de tristeza e revolta, uma mulher tomou o microfone para dizer: “Agora, caiu Maria e caiu Zé Cláudio. Mas, ao mesmo tempo, se levantaram outras cem Marias e ouros cem Zé Cláudios para dar continuidade ao trabalho deles, para defender a floresta.”

Após o funeral, estava prevista uma reunião entre autoridades do governo e líderes de movimentos sociais no assentamento em que o casal assassinado vivia. Entre os amigos e parentes, o temor é que a impunidade prevaleça. Sobretudo após a Secretaria de Segurança Pública do Pará afirmar que desconhecia as ameaças contra José Cláudio, apesar de a imprensa ter noticiado o fato. O ouvidor agrário nacional, Gercino José da Silva Filho, também disse que o casal não constava em nenhuma relação de ameaçados em conflitos agrários. “Ele e seu advogado nos procuraram em novembro do ano passado, mas quando íamos nos reunir, eles cancelaram. Depois não marcaram outra data. O assunto morreu.”

As declarações geraram desconforto entre os participantes do funeral. “Nosso cotidiano era de ameaça permanente. Acordávamos quase todo dia com os cachorros assustados, com picapes rondando a casa”, comenta Laísa Santos Sampaio, de 45 anos, irmã de Maria e vizinha do casal assassinado.

Também ameaçado de morte, Charles Trocate, líder do Movimento Sem Terra (MST) na região, manifestou pesar e preocupação. “Ninguém deseja morrer, muito menos por morte mandada, morte executada por profissionais da morte.” O advogado da Comissão Pastoral da Terra (CPT) José Batista diz que as organizações sociais vão continuar pressionando o governo para denunciar os crimes ambientais e os conflitos fundiários na região. “A luta agora é para que não haja impunidade.”

A ministra do Meio Ambiente, Izabella Teixeira, enviou um comunicado de condolências à família, mas não compareceu ao velório. Para justificar a ausência, comunicou que estaria à frente de uma operação de combate ao desmatamento em Sinop, no Mato Grosso. Como representante da pasta, o secretário nacional de Extrativismo e Desenvolvimento Rural Sustentável, Roberto Vizentin, declarou “absoluto repúdio” à morte do casal ambientalista. “Eles viviam num assentamento agroextrativista, especialmente criado para o manejo sustentável dos recursos florestais, mas não era bem assim que as coisas funcionavam. O casal sempre denunciou a atuação de madeireiras na região.”

Entre as medidas anunciadas pelo secretário está a intensificação das ações de fiscalização em Nova Ipixuna. “Não se trata de promover uma caça-às-bruxas aos assentados que são pagos para derrubar a floresta, até porque eles constituem o elo mais fraco dessa criminosa cadeia produtiva. Mas vamos fechar o cerco àqueles dispostos a comprar e revender as árvores derrubadas”, afirmou Vizentin a CartaCapital. “Para os assentados, a estratégia é desenvolver ações para fortalecer a economia florestal sustentável, para que esses trabalhadores tenham uma fonte segura de renda e não precisem derrubar a mata para sobreviver.”

Para Laísa, o exemplo da irmã e do cunhado prova ser possível viver da floresta sem destruí-la. “Eles eram filhos de castanheiros extrativistas. A raiz deles era a ideologia da floresta. Minha irmã sempre dizia que a economia da floresta era viável. Cada árvore derrubada vale de 80 a 100 reais, ao passo que um litro de óleo de castanha vale bem mais, pode custar até 150 reais”, comenta.

Impunidade
Nos últimos 25 anos, 1.614 pessoas foram assassinadas no Brasil em decorrência de conflitos no campo. Até hoje, apenas 91 casos foram julgados – e resultaram na condenação de 21 mandantes e 72 executores. Isso significa que a Justiça no Brasil levou às grades um criminoso para cada 17 pessoas assassinadas em todos esses anos.

O levantamento, feito pela reportagem de CartaCapital com base em números fornecidos pela Comissão Pastoral da Terra (CPT), indica a situção de impunidade existente no País. Os números contabilizados se referem aos crimes ocorridos entre 1985 e 2010.

Somente na última década, 376 pessoas foram assassinadas em decorrência de conflitos no campo motivados denúncias como desmatamento e assentamentos. O Pará é, disparado, o recordista de ocorrências: entre 1985 e 2010 foram registrados 408 casos (cerca de 35% dos incidentes no Brasil), com 621 vítimas. Destes casos, apenas 15 tiveram julgamentos, com 11 mandantes e 13 executores condenados. Hoje, porém, apenas o fazendeiro Vitalmiro Bastos de Moura, que encomendou a morte da missionária americana Dorothy Stang em 2005, está preso por estes crimes.

Suspeito de ser o mentor do crime, Regivaldo Pereira Galvão foi condenado a 30 anos de prisão, mas aguarda o recurso apresentado em sua defesa em liberdade. O pistoleiro Rayfran das Neves Sales, condenado a 28 anos de prisão, acusado de ser o executor do assassinato, cumpre pena em regime semi-aberto desde 2010.

História que se repete
O assassinato dos extrativistas José Cláudio Ribeiro da Silva e Maria do Espírito Santo da Silva são os mais recentes casos de ocorrências envolvendo conflitos de terra no estado. O casal foi alvejado em Nova Ipixuna, a 390 quilômetros de Belém, região onde vivia há 24 anos.

Integrantes do Conselho Nacional das Populações Extrativistas, organização criada pelo ambientalista Chico Mendes – morto em 1988 pelo fazendeiro Darly Alves da Silva e seu filho, Derli -, defendiam o manejo sustentável da floresta, denunciando extração ilegal de madeira, desmatamento e carvoarias ilegais.

Ameaças

Há cerca de um mês, um grupo suspeito teria invadido a propriedade do casal e disparado tiros para o alto e contra animais. Além disso, em um vídeo de novembro de 2010, gravado durante uma palestra sobre a preservação da floresta amazônica, José Cláudio afirmou que sofria ameaças.

“A mesma coisa que fizeram no Acre com Chico Mendes querem fazer comigo. A mesma coisa que fizeram com a Irmã Dorothy querem fazer comigo. Eu estou aqui conversando com vocês, daqui um mês vocês podem saber a notícia que eu desapareci. Me perguntam: tenho medo? Tenho, sou ser humano, mas o meu medo não me cala. Enquanto eu tiver força pra andar eu estarei denunciando aquele que prejudica a floresta”, disse.

Publicado na Revista Carta Capital. 

Written by Felipe Milanez

August 31, 2011 at 8:02 pm

ZÉ CLÁUDIO E A MAJESTADE.

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POR FELIPE MILANEZ

Foto: Felipe Milanez

Fui conhecer a Majestade, a maior castanheira do lote de José Cláudio Ribeiro da Silva e dona Maria do Espírito Santo da Silva. Maior castanheira que eu já vi na vida, maior castanheira que ele, também, diz já ter visto. O casal vive da coleta de castanha e extração de essências da floresta, no assentamento extrativista Praia Alta Piranheira, no violento sudeste do Pará. Negam-se a negociar árvores da floresta como madeira com madeireiros da região, que serram ilegalmente até as castanheiras – que são protegidas por lei.

Foto: Felipe Milanez

Recentemente o Ibama fechou duas serrarias em Nova Ipixuna, cidade mais próxima do assentamento, justamente pelo fato de terem sido encontradas castanheiras nos pátios onde as toras eram guardadas. Conscientes da ilegalidade, e de que a prática predatória é insustentável e vai levá-los à miséria, ao fim da floresta e, consequentemente, a perder a terra para a pecuária, como querem os fazendeiros do entorno, eles resistem à pressão e não vendem madeira ilegal – além de denunciarem os crimes. Atuam sozinhos, quase sem apoio de sindicato, apenas da Comissão Pastoral da Terra. Foram abandonados pela maioria das famílias do assentamento, que desistiram da resistência junto com eles na vida extrativista e sucumbiram ao aliciamento para vender as árvores, e a queimar o resto da floresta para produzir carvão para a indústria siderúrgica em Marabá. Pela atuação política que travam em defesa da floresta, são ameaçados de morte.

A Majestade é linda e imponente, com quase 11 metros de diâmetro. Tem o lindo corpo das castanheiras, longilíneo, cuja copa abre-se como um buquê, no alto, dominando o dossel. “Quando eu morrer, quero ser cremado e minhas cinzas jogadas no pé da Majestade”, confidencia. Por vezes, conta Zé Cláudio, ele para em frente ao tronco enorme e conversa com a Majestade. Enquanto retornávamos pela mata, perguntei algumas coisas pra ele.

Vice: Quando uma árvore dessas é cortada, a seiva te lembra sangue?
Zé Cláudio: 
Meu amigo, ela exala um cheiro quando está sendo cortada, que você sente. Quando vai cair, ai você escuta o gemido dela: ela range, no tronco. Aí você vê as folhas mexendo-se como quem vai dando adeus. Tshhhhh… Aí você escuta um estrondo: treummm…. E mais um gigante da selva tombou. Outro dia estávamos aqui e escutamos a moto-serra zunindo. E veio o estrondo. Falei para a dona Maria: “vamos lá?” “Vamos”. Caiu bem perto do nosso lote, mas não chegou a cair na nossa terra. Eles iam derrubando tudo.

Foto: Felipe Milanez.

Você sente como um outro ser que morre?
Eu sinto como se um cara matou alguém. Porque é um ser vivo. Tem uma música que diz que se a floresta tivesse pé para andar, ela não ficaria aqui. Se sentisse o perigo, saía. Mas daí o cara chega, limpa ao redor, acelera a moto-serra. Rom, rom, rom… E ela ta lá quietinha. No lugar dela. Só sentindo a dor. O que a natureza leva anos e anos para fazer, o cara acaba dentro de uma hora. Menos de uma hora, tudo isso, em nome do capital. Tudo em nome do “se dar bem”. Tudo em nome do “ah, eu sou o empresário fulano de tal”; “eu exportei 100m3 de madeira pros Estados Unidos, pro Japão, não sei pra onde”; “eu tive um lucro de tanto esse ano”. Às custas da floresta, de algo que ele não plantou, de algo que ele não gastou um centavo para fazer. É muito fácil ganhar dinheiro desse jeito. E nem as responsabilidades que ele tem, em pagar os impostos, nada ele cumpre. É sempre driblando fiscalização, fazendo as coisas ilegais, trabalhando ilegalmente. Só a ponto de enriquecer. Pode? Se ao menos fizessem as coisas dentro da legalidade… Porque a castanheira é proibida de ser cortada em todo o território. E por que cortam? E acham quem compra. Aí depois falam: não sei quem está trabalhando sobre meio ambiente. Mas esse alguém compra a madeira ilegal que sai daqui. De castanha, que é ilegal. Do mogno, que é ilegal. Da andiroba, que é ilegal. Da copaíba, que é ilegal. E por que compram? Por que não procuram a origem?

Publicado na Vice Magazine.

Written by Felipe Milanez

August 31, 2011 at 7:25 pm

EM CARTA, FAMÍLIA DE EXTRATIVISTAS ASSASSINADOS PEDE JUSTIÇA

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POR FELIPE MILANEZ
DE SÃO PAULO (SP)

Claudelice (esquerda) e Laisa Santos Sampaio (direita) entregam um abaixo assinado para autoridades pedindo a federalização das investigações do duplo assassinato.

Os familiares de José Cláudio Ribeiro da Silva e Maria do Espírito Santo da Silva têm vivido uma cruzada por justiça desde o assassinato do casal, em 24 de maio, numa emboscada no assentamento onde viviam, em Nova Ipixuna, Pará. Desde então, a polícia civil entregou o inquérito, apontando um mandante e dois pistoleiros. O juiz estadual, após negar dois pedidos de prisão, assinou o mandado, sob pressão social e já com a queixa do Ministério Público. Enquanto isso, os acusados fugiram, e a polícia federal ficou imobilizada pela justiça federal, que negou a competência para apurar a julgar o crime.

Sem justiça pelo judiciário, os familiares deram início a uma peregrinação, campanhas, abaixo assinados, busca por justiça tentando provocar uma pressão política. Foram a Brasília, a Belém. Encontraram-se com ministros – como a ministra do meio ambiente, Izabela Teixeira, num encontro de populações extrativistas em Marajó, no inicio de agosto. Repetem, em conversas, que “a presidenta Dilma mandou a polícia federal investigar” – em alusão ao pronunciamento de Dilma no mesmo dia do assassinato. E pedem que o caso seja federalizado – uma chance de minimizar a sensação de impunidade característica da justiça estadual no Pará, na visão das populações pobres do campo.

Impossibilitada de ir a Belém em um evento da Central Única dos Trabalhadores – CUT -, Claudelice, irmã de Zé Cláudio, escreveu uma carta, reproduzida abaixo, que pede que seja lida na plenária. Recentemente, os próprios familiares que vivem dentro do assentamento Praia Alta Piranheira passaram a receber ameaças de morte. Sentem que defender a memória da luta de Zé Cláudio e Maria é visto como provocador em uma terra sem lei. E temem que, com imunidade e a legitimação da violência pela oligarquia local, mais pessoas inocentes podem vir a ter o mesmo destino ceifado. Nesse ano, seis trabalhadores rurais já foram assassinados no sudeste do Pará. Ninguém foi preso.

***

“Carta de desabafo

Toda uma luta por um ideal

Nós, da família de José Cláudio Ribeiro da Silva e Maria do Espírito Santo, declaramos ao mundo que somos defensores da Floresta Amazônica, da não degradação do meio ambiente, somos a favor da luta contra o desmatamento desvairado, sem planejamento. Somos a favor da vida, e isso se resume numa luta por uma causa que nós acreditamos que seja a luta certa. A luta coerente, no sentido da subsistência da sustentabilidade humana.

Desde que o meu irmão, José Cláudio Ribeiro da Silva, conhecido como Zé Cláudio, e minha cunhada, Maria do Espírito Santo, conhecida como Dona Maria, foram assassinados, a luta pela justiça, é uma constante, mesmo quando tudo parece conspirar contra.

Excepcionalmente na pessoa ilustre, sincera e humilde até hoje vivendo no assentamento da forma mais simples, o Seu Zé Ribamar, aquele que pela primeira vez falou desse Partido dos Trabalhadores a meu irmão Zé Cláudio que também humildemente teve-o como base na questão política da época, não só do mesmo quanto de também da várias organizações muito respeitadas como CPT Comissão Pastoral da terra, SEPASP, CNS Conselho Nacional dos Seringueiros e o próprio PT, na construção e elaboração, formação e mobilização de um projeto de assentamento diferenciado onde a filosofia de produção era diferente, levando em consideração a comunidade tradicional local e o equilíbrio entre a produção e conservação. Em 1997 foi criado o primeiro projeto de assentamento Agro-extrativista da região sul e sudeste do Pará com inúmeros desafios, sentimentos e propostas distintas aos fazendeiros e madeireiros da região, também, mais ainda com um comprometimento unânime e decisivo do governo da federação, ou seja, vários interesses inclusos e exclusos dentro de um espaço onde, na verdade, muitos estariam inseridos. Desde então, claramente, na história de luta e de vida de Zé Cláudio e Maria houve o contraste e o diferencial. Acreditando ser uma luta justa, verdadeira, onde traria (e trouxe) benefícios reais a todos os contemplados do PAE – praia alta e Piranheira, iniciaram uma verdadeira batalha tanto pelas questões agrárias, ambientais, quanto pela questão humanitária, já que ali, naquele lugar, esquecido pelas autoridades, existia vida, sentimento, filhos, futuro, menos lei.

Assim, nesse mesmo tempo e espaço onde foi construído, e quando se apaixonaram pelo PT e pela certeza de um socialismo e de uma sociedade justa, onde todo mundo vivia sustentavelmente, igualitariamente, no mesmo local onde lutas de mais de duas décadas por um ideal, foram travadas além da luta por um Partido em especial, o PT, a qual acreditaram, lutaram, militavam, todos os dias de suas vidas a favor deste, inclusive sendo decisivos e influentes em eleições partidárias; não encontraram a reciprocidade nem mesmo depois de suas mortes, sequer reconhecimento póstumo, nem mesmo póstumo. Inclusive de pessoas da mesma militância do próprio município, onde tiveram uma luta leal, integra e incondicional mesmo com as turbulências muito preocupantes, que estava se concretizando nas mentes dos grandes mandantes do crime, e que sabedouros disso, nunca baixaram a guarda em favor da floresta em pé, em favor do meio ambiente, em favor das pessoas que estão ao pé da floresta.

Peço que os olhem com olhar de um guerreiro olhando para com o outro guerreiro morto em batalha, porém eternizado em sua luta e sua lealdade com a causa pela qual acreditava.

Por Claudelice Silva dos Santos e família e amigos valiosos.

Marabá, 31 de agosto de 2011″

Publicado no Terra Magazine. 

Written by Felipe Milanez

August 31, 2011 at 6:58 pm

MEDO E TENSÃO NO OESTE

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Paraíso Perdido na Amazônia, a Região de Nova Olinda vive em conflito: de um lado, comunidades a favor da extração da madeira; de outro, aquelas que  querem manter suas terras. O impasse continua.

POR FELIPE MILANEZ

Written by Felipe Milanez

August 31, 2011 at 6:44 pm

SOMBRAS DA SELVA

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No começo de agosto, dois índios de uma tribo que muitos consideravam extinta foram localizados no noroeste do Mato Grosso. Conhecidos como “piripkuras”, são sobreviventes de um massacre. A eterna rota de fuga dos misteriosos Tucan e Mande-í revela não apenas a saga de um povo perdido mas também a barbárie oculta sob o desmatamento na Amazônia.

POR FELIPE MILANEZ.

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Diz um famoso ditado entre os sertanistas que, “no mato, quem não quer ser visto deve ficar calado”. Por isso, assim que ouviu uma risada entre as árvores, o experiente Jair Candor também sorriu. Era 7 de agosto e, com a estiagem na Amazônia, o chão ardia da seca e das queimadas no norte do Mato Grosso.

Depois de cinco meses e várias expedições da Frente de Proteção Etno- Ambiental Madeirinha, tudo o que seus exaustos integrantes haviam visto eram vestígios antigos de presença indígena nada inspiradores. Agora, com a simples risada, tudo mudava. A esperança da sobrevivência de dois índios remanescentes de massacres estava prestes a confirmar-se.

“Ficar um mês direto dentro da floresta não é fácil. Estávamos esgotados”, lembra-se Candor. “Insisti para seguirmos até o fim do igarapé Garcinha, mas foi só andar um pouco mais para ouvi-los conversando e encontrar pegadas. Estavam rindo alto, num papo animado. Paramos. Desci até a margem e esperei.”

O sertanista não se esquece dos detalhes do encontro. “Quando os dois passaram, saltei na frente deles. O mais velho ameaçou me agredir, mas logo viram que éramos gente amiga.” Rita e Aripã, dois índios da expedição que agiam como intérpretes, começaram a conversar. “Então, eles aceitaram ir conosco até o acampamento”, completa Candor. “Sem a risada, a expedição teria passado a 30 metros deles, e não conseguiria contato.”

Ninguém sabe exatamente ainda a que etnia pertencem os dois índios buscados por Candor e sua equipe, mas a Fundação Nacional do Índio (Funai) refere-se a eles como Piripkura, um nome dado anos atrás pelos índios gaviões, também do noroeste do Mato Grosso.

Sabe-se apenas a língua que falam, o tupi-kawahib (os povos indígenas dividem-se em famílias lingüísticas, e dentro delas existem as línguas e, culturalmente, as etnias). A despeito das incertezas, o encontro com os piripkuras talvez seja a descoberta mais relevante do indigenismo brasileiro no século 21.

Desde que o etnólogo Curt Nimuendaju e o antropólogo Levy-Strauss passaram pela região, antes da metade do século passado, sabia-se da existência de um grupo tupi-kawahib habitando essa parte da floresta, há muito cobiçada por grileiros e madeireiros. Todavia, com a falta de novos sinais e a vulnerabilidade da área – não há reserva demarcada -, eles foram tidos como dizimados, até que, nos anos 1980, surgiram evidências de uma família com cerca de 20 índios morando nas proximidades do rio Pardo, 70 quilômetros ao norte de onde os dois piripkuras foram encontrados.

Essa aldeia nômade ainda resiste? Como estão vivendo? O contato de agora poderá revelar a história de um povo que parece estar fugindo da colonização, a cada dia mais próxima e ameaçadora nesse rincão da Amazônia Tucan, cerca de 50 anos, o mais velho dos dois piripkuras, estava doente.

No acampamento, a enfermeira Joelina Ribeiro Jorge, 57 anos, notou que a urina dele tinha “cor de Coca-Cola”, o que explicava as fortes dores no estômago que ele sentia, e decidiu mandá-lo para Ji-Paraná, em Rondônia. Sua vesícula estava necrosada. “Ele tinha pedras na vesícula do tamanho de bolas de gude. Uma semana mais e morreria”, relatou o cirurgião que o atendeu.

Para piorar, depois de 15 dias na cidade, Tucan contraiu catapora. O outro índio, Mande-í, de uns 35 anos, ficou com a equipe de campo. Mas, entediado com as novas companhias e a monotonia do acampamento – ou talvez por pensar que Tucan estivesse morto -, voltou para a floresta, uma semana depois.

O período em que Tucan convalesce tem sido útil aos intérpretes que tentam desvendar o mistério do seu povo. Quando abro a porta do quarto no hospital de Ji-Paraná, o índio está estirado sobre uma rede. Parece desidratado, e o braço estendido deixa correr soro pelas veias.

São quase 10 da manhã, e Mauro de Oliveira tenta apresentar-me a Tucan. Oliveira aprendeu a falar tupi-kawahib após o contato, em 1987, com índios uru-eu-wau-waus no leste de Rondônia. Hoje trabalha para a ONG indigenista Kanindé.

“Tapu’unha icatu”, diz ele para Tucan. “Branco bom”, traduz para mim. O índio tem o olhar distante. Sua pele é dura, cheia de calos grossos. E falta a ponta do dedo médio de sua mão direita: foi comida por um porco queixada.

Tucan não fala nada. Dias depois, porém, com a cicatrização do corte de 23 pontos em seu abdômen e muitos goles de água com mel, ele se mostra mais à vontade com estranhos. Passa a contar histórias, gesticular. Certo dia, afunila o rosto e faz bico numa careta engraçada: imitava uma anta, contando vantagens da vez em que roubaram o animal, caça de uma onça-pintada.

Os casos que Tucan descreve nos ajudam a entender a extraordinária capacidade de sobrevivência dos dois piripkuras em sua eterna rota de fuga. Sem fazer flechas, eles caçam apenas com pedaços de pau ou com um facão e um machado que acharam na floresta. O índio conta repetidas vezes uma história sombria.

“Ele se lembra de um grupo de índios que atravessou um grande rio, que deve ser o Roosevelt, em uma canoa”, traduz Oliveira. “Mas, quando chegaram ao outro lado, um punhado de brancos começou a atirar. Vários índios morreram.

Os brancos pegaram a canoa e fizeram o trajeto inverso pelo rio. Os outros índios, que estavam na margem oposta, fugiram. Mas os brancos seguiram seus rastros e chegaram à aldeia.” Tucan senta-se na rede e junta os punhos, como se portasse algemas.

“Ele diz que estava sobre uma árvore, colhendo mel. Desceu rápido e ficou olhando de longe, escondido. Amarraram as mãos de seus parentes. Depois, cortaram a cabeça deles, uma a uma”, prossegue Oliveira. “Juntaram as cabeças com os corpos e atearam fogo. Tucan diz que saiu correndo. Depois reencontrou Mande-í e outros.”

Formalmente, essa selva de barbáries em que habitam Tucan e Mande-í situa-se em Colniza, município com quase 28 mil quilômetros quadrados – área equivalente à do estado de Alagoas.

Quem vive lá sabe quão impreciso é o índice de 165 assassinatos por 100 mil habitantes, números que, oficialmente, já fazem dela a cidade mais violenta do país. A questão é que, “nessas estatísticas, eles só contam quem morre no hospital”, comenta o dono de um pequeno restaurante.

“Se forem contabilizar quem perde a vida no campo, onde acontecem assassinatos todos os dias, Colniza seria pior que Bagdá”, compara. Num hotel no bairro de Guariba, um jovem, que pede para não ser identificado, pinta um bom retrato da cidade: “Aqui, as pessoas são mortas”, diz ele. “Apenas isso. Simplesmente são mortas, sem que ninguém as tenha matado.”

O caminho para Colniza é a estrada de terra desde a divisa com Rondônia, uma viagem de 500 quilômetros por um cenário apocalíptico em que, no auge da seca, nuvens de poeira, caminhões carregados de tora e queimadas ilustram boa parte do trajeto.

O desmatamento no município é aterrador. Chegamos à cidade no dia seguinte ao de uma operação da Polícia Federal na qual foram presos 40 bandidos, a maioria pistoleiros, mas era como se nada de anormal tivesse acontecido. A criminalidade tornou-se um assunto banal.
Sempre foi assim.

O norte mato-grossense era uma terra esquecida nos anos 1970, quando povos indígenas, como os piripkuras, sofreram os maiores massacres. Habitada por seringueiros, a região não contava com nenhuma estrutura de ocupação. Em 1973, a tênue estabilidade seringalista terminou.

O grileiro conhecido pelo nome de Reveria determinou que fosse desmatada uma extensão de 90 quilômetros ao longo do rio Roosevelt, nas duas margens, com uma largura de 3 quilômetros. Os ribeirinhos correram para o mato, entrando em contato com índios isolados.

Após esse primeiro conflito territorial, em 1975 um grupo madeireiro fundou a Colonização Indústria e Comércio Ltda., com a sigla de Colniza, cuja sede ficava próxima ao rio Aripuanã. O Estado passou a distribuir títulos de terras para pessoas influentes. Foi o começo da grilagem em uma das regiões mais vulneráveis e menos protegidas de toda a Amazônia.

Tradicionalmente espremidos entre grupos gês, a leste, e os também guerreiros mondés, a oeste, os pacíficos e nômades tupi-kawahibs sobreviveram usando suas técnicas de esconderijo na floresta, matando a fome com a caça e a coleta.

O nome Piripkura é uma espécie de apelido dado pelos inimigos índios gaviões, do grupo Mondé. Significa borboleta, mariposa. Aqueles que não param em nenhum lugar e são frágeis.

Outro protagonista desse drama é a índia conhecida como Rita. Integrante da equipe de campo do sertanista Jair Candor, ela é uma piripkura desgarrada do grupo. Aparentando ter cerca de 40 anos, sua história de vida é tenebrosa.

Em 1984, um piloto de avião fez uma denúncia de que havia uma índia escravizada em uma fazenda da região. A Funai resgatou Rita e constituiu, com a missão cristã Operação Amazônia Nativa (Opan), uma frente de trabalho para demarcar uma terra indígena no território kawahib. Rita foi levada para viver entre os karipunas, no norte de Rondônia, também falantes do tupi-kawahib.

Em 1991, sem que houvesse demarcado a terra dos índios isolados, a frente Madeirinha foi deslocada para outra área. Rita acompanhou esse trâmite a distância, até que passou a ser requisitada pela Funai para servir de intérprete nas expedições recentes. Dessa vez havia uma dificuldade especial: reencontrar parentes que ela havia abandonado.

Diz a índia que os piripkuras a evitam desde que ela se recusou a casar-se com Tucan quando ainda vivia no mato. “Meu marido antigo morreu, e Tucan matou meus dois filhos para ficar comigo”, diz ela.

Dentro de um ritual tradicional, ele teria cortado o escalpo das crianças e as enterrado. Não se sabe se isso é verdade. Mas foi nessa época que Rita e outro homem decidiram sair pela floresta em busca de mais índios para formar novas famílias. O cerco a que estavam submetidos os fez bater, ingenuamente, à porta de uma fazenda.

Rita virou escrava sexual. O índio que estava com ela foi colocado dentro de um avião e nunca mais foi visto. Rita sempre escondera seu passado. No entanto, ao reencontrar Tucan e Mande-í, decidiu contar o que sabia. Ela recorda-se da vida com seus pais, de uma prima, de uma senhora que chama de avó, de irmãs e de outros homens.

Junta nos dedos entre nove e 11 pessoas que viviam com ela. Mesmo com dificuldade para se expressar em português, descreve os ataques que sofreram. E detalha rituais de canibalismo que praticavam.

“Uma vez, estava todo mundo dormindo. Chegou um monte de branco atirando. Uma prima, que estava na rede, e outra prima, mais velha, que dormia no chão, todas morreram. Um índio flechou um branco bem aqui na costela. Fugimos de noite e dormimos no mato. No outro dia, minha avó e minha tia voltaram para lá, só elas. Cortaram toda a carne dos parentes que estavam mortos, os dedos, a barriga, e levaram embrulhado na casca de buriti. Para a gente comer”, relata devagar, com os olhos fixos em suas mãos. Até rever Tucan e Mande-í, ela acreditava que toda a sua nação havia sido morta.

A 70 quilômetros de onde os piripkuras foram encontrados, a Funai está demarcando a Terra Indígena Kawahib do Rio Pardo, onde vive o grupo isolado, com mais de 20 pessoas, avistado nos anos 1980. Com base no relato de Tucan, é possível supor que sejam parentes, separados no massacre do rio Roosevelt.

No entorno dessa região, a Funai afirma ter outras cinco evidências de índios isolados, hoje ameaçados por grileiros e madeireiros que temem perder as terras que exploram. “Há fortes evidências de que existam mais índios na área”, afirma Elias Bigio, coordenador-geral de Índios Isolados da Funai. A instituição deu início ao processo de demarcação de uma futura terra indígena interditando a área onde Tucan e Mande-í foram localizados.

Tão logo deixe o hospital, Tucan vai voltar para o acampamento na mata. Espera-se que, com isso, Mande-í reapareça. Os sertanistas cogitam a possibilidade de andar com eles por outras áreas em que ainda existam índios sem contato na região.

Se estiver correta a teoria de que foram separados pelo massacre do rio Roosevelt e, posteriormente, isolados em ilhas cortadas por estradas clandestinas e pela ocupação, é possível que, no futuro, uma grande nação Kawahib seja refeita – um símbolo de esperança em uma Amazônia a cada dia mais ameaçada.

Publicado na Revista National Geographic. 

Written by Felipe Milanez

August 31, 2011 at 5:58 pm

A OUTRA MARGEM DO RIO

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Na Calha Norte do Rio Amazonas, em terras paraenses, projeta-se uma floresta intocada que só agora os cientistas começam a decifrar.

POR FELIPE MILANEZ

Foto de Adriano Gambarini. Ao amanhecer, nuvens de vapor sobem da mata úmida no norte do Pará. Na região montanhosa e isolada, a geografia ocupou-se de afastar a colonização, permitindo que a floresta se mantivesse soberana.

O latido parou. Com a decepção estampada no rosto, o biólogo Marinus Hoogmoed senta-se em uma pedra ao lado da corredeira, decide descascar laranjas e esperar o tempo passar. Guiado pela fraca luz de uma lanterna de cabeça, o biólogo permanece atento. A noite na Amazônia é submersa em sons misteriosos. Há grunhidos ritmados de insetos, como a percussão de grilos, e uma orquestra melódica de rãs, sapos e pererecas que coaxa insistentemente atrás de sexo. Os machos, excitados depois do longo período de seca, competem em serenatas para atrair parceiras logo após as primeiras chuvas de inverno.

O biólogo distingue cada ruído como se fosse um maestro. O latido poderia enganar um ouvinte leigo, mas não o experiente Hoogmoed: é de anfíbio e destoa de todo o resto, provocando sua imaginação. Ele está em dúvida sobre a classificação da rã que late – o que espera resolver assim que pegar o animal que ele persegue há quatro noites. Escondido no vão de uma pedra, o bicho decide se calar. Mesmo cansado, Hoogmoed prossegue. Desiste de retornar ao distante acampamento. Guarda a esperança de que a rã volte a se excitar e a latir, denunciando em alto e bom som sua localização exata.

Estamos sobre uma montanha de rochas vermelhas, cercada por uma vegetação áspera. O ar é fresco e úmido, a temperatura está agradável. Não chove, a lua é minguante e o céu está estrelado. Marinus Hoogmoed, pesquisador do Museu Paraense Emilio Goeldi e ex-curador do Museu de História Natural da Holanda, ouve essa escuridão com atenção. Depois do crepúsculo, à noite é o melhor momento para encontrar anfíbios. “Estes rochedos no meio da floresta, rodeados de savanas, possuem uma fauna particular”, comenta ele entusiasmado. O bicho que late é preto com bolas vermelhas. Restam poucas dúvidas de que se trata de um Leptodactylus myersi, um tipo de rã-pimenta. O latido que escutamos agora é o primeiro registro científico da espécie no estado do Pará. Hoogmoed permanece em busca do espécime até altas horas – quando enfim consegue capturá-lo.

A nosso redor estende-se uma floresta gigante e intocada, a Amazônia do planalto das Guianas, na margem setentrional do rio Amazonas. Em uma linha imaginária, estamos próximos ao Suriname; a localidade mais perto é Brownsweg. Os rios que correm por ali não são navegáveis. Cachoeiras e montanhas cortam qualquer percurso. A população indígena é pequena e esparsa, tendo o povo zo’é ao centro geográfico. Há relatos de índios sem contato. Nunca brotaram seringueiras, o que deixou de atrair colonos para a coleta de borracha ao longo do século passado. Pela foz do rio Trombetas, escravos fugidos no século 19 formaram quilombos e hoje colhem castanhas na época das chuvas. Garimpeiros escavam a várzea dos rios Jari e Maicuru, em direção ao Amapá, enquanto alguns madeireiros furam as matas próximas ao rio Amazonas. Não há mais gente além dessa população que, em cálculo aproximado, indica menos de 5 mil pessoas em um território do tamanho do estado de São Paulo.

Essa região, conhecida como “calha norte” do Pará, em referência a sua localização ao norte do rio Amazonas, intacta devido à barreira natural de acidentes geográficos, começava nos últimos anos a sofrer grilagem e exploração predatória e preparava-se para receber grandes mineradoras. Hoje é, ao menos no papel, um território de preservação. Em dezembro de 2006, um decreto estadual criou cinco unidades de conservação, com suas fronteiras emendadas de forma contínua a terras federais e reservas indígenas, no que se constituiu o maior mosaico de floresta tropical preservada no mundo. As áreas protegidas totalizam quase 22 milhões de hectares.

Para que essas unidades sejam implantadas, é preciso a realização de pesquisas que descrevam, mesmo que na forma de amostragem, a ecologia da calha norte. Os estudos devem servir de fundamento aos planos de manejo. As sete expedições planejadas são a primeira chance de biólogos estudarem, no Pará, a região de endemismo conhecida como Guiana – uma das oito áreas da Amazônia que, divididas por grandes rios, desenvolveram fauna e flora únicas. A logística foi financiada pela mineradora Rio Tinto como compensação pela prospecção e pelo estudo da existência de bauxita por lá. Coube ao Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia (Imazon) a análise socioeconômica e cartográfica, enquanto a da biodiversidade ficou a cargo do Emilio Goeldi, ambas instituições de Belém.

Ora em ziguezague, ora enfrentando a cortina úmida, o helicóptero faz seu percurso por blocos de chuva que caem de forma esparsa. A floresta vai até onde os olhos alcançam. A mata é densa e lembra um gigantesco campo de brócolis. Ela ergue-se sobre o relevo, debruça-se em rochas expostas em desfiladeiros e esparrama-se no meio de vales. Em terras de solo mais pobre surgem as manchas claras dos campos de savanas. Os rios são finos, marrons, caudalosos e encachoeirados. Espumas brancas das corredeiras marcam os cursos, e as margens são tomadas por uma vegetação ainda mais consistente.

Alexandre Aleixo, biólogo especialista em aves, está a meu lado. É o chefe das expedições científicas. Ao contrário de mim, deslumbrado, ele observa com um olhar blasé o tapete verde – essa é sua sétima expedição. Agora, Aleixo quer descansar. Em campo, ele caminha ao menos 10 quilômetros por dia em trilhas abertas por mateiros e coordena as outras equipes de biólogos, cerca de 30 pessoas.

“Esta é a única parte da Amazônia aonde o Estado veio antes do problema”, explica Adalberto Veríssimo, pesquisador sênior do Imazon. O “problema”, no caso, é o avanço da fronteira de ocupação predatória que recentemente começou a se estabelecer na calha norte do rio Amazonas. A demora no desembarque de colonos deu-se graças ao terreno intransponível. Isso ocasionou a desistência de projetos públicos anteriores de colonização, especialmente os megalomaníacos do período militar. A ideia de fazer a estrada perimetral Norte, que ligaria o Amapá a Roraima e atravessaria de ponta a ponta essa região, ou uma possível ampliação da BR-163 de forma a abrir uma via de acesso a esse lado do rio Amazonas, teria sido fatal para a floresta. Mas os projetos ao menos não saíram do papel. “Em nossas pesquisas, constatamos a existência de uma estrutura de grilagem no mesmo modelo do conflituoso sul do Pará”, aponta Veríssimo. “Mas era incipiente; e, com a criação das unidades de conservação, os títulos de terra falsos foram declarados nulos. Isso cessou um processo inicial de desmatamento.”

Definir a titulação das terras como unidades de preservação foi uma negociação política hábil. O objetivo dos ambientalistas era preservar a maior área possível de florestas. No papel, por enquanto, conseguiram. A mineradora Rio Tinto pressiona, ainda hoje, por uma fatia da Estação Ecológica do Grão-Pará para prospectar bauxita. De acordo com o gerente de exploração da empresa, Marcos Diógenes, o fato de ser uma “estação ecológica”, de preservação total, inviabiliza o uso do que pode ser uma das maiores jazidas de bauxita do Brasil.

A logística é um empecilho para a fronteira econômica, e é possível que continue assim. Às florestas estaduais, em que são permitidos a mineração e o uso sustentável, o acesso é difícil. Levar a produção até o Amazonas, o eixo de transporte, implica atravessar um relevo acidentado. E o preço da madeira e do minério no mercado internacional pode não justificar o investimento. Já nas áreas próximas do Amazonas, em que a taxa de desmatamento é crescente, o problema será controlar a indústria madeireira.

São 5 da madrugada. Faz frio. Está escuro e a floresta, em raro silêncio, ainda dorme. Aleixo tem fome. Ele devora seu café da manhã com disposição. A marmita do almoço, preparada por um sonolento mestre-cuca, virá com linguiça frita e arroz. O biólogo carrega 2 litros de água filtrada – “sinto muita sede”, diz. Seu equipamento, que inclui espingarda, microfone e amplificador, tocador de MP3, cartuchos, capa de chuva e mais uma série de coisas, está separado desde a noite anterior. Aleixo é metódico.

Ao longo de 5 quilômetros, vamos subir morros íngremes, atravessar terrenos secos de savana e pedras e seguir por uma mata densa até culminar em um banhado. A floresta começa a despertar ao som agudo de insetos até que o canto melódico dos pássaros anuncia a claridade. O dia está nublado, e as folhas, molhadas do sereno. Em um universo invisível a nossos olhos, o ornitólogo aprende a “ver” com os ouvidos e a distinguir a comunicação de cada animal cantor, seja inseto, seja anfíbio, seja ave.

A menos de mil metros do acampamento, um som fino se desvia através da vegetação densa. Aleixo identifica no aparelho iPod o nome científico da espécie para reproduzir no alto-falante. É um Hemitriccus inonartos, um passarinho que se mostra indignado com a pirataria do som de algum outro espécime. “A natureza é sexo e guerra”, reflete Aleixo. “Não é à toa que eles são descendentes de dinossauro”, brinca. A ave não suporta dividir seu território com outros machos, e vem rapidamente em nossa direção disposta a um enfrentamento. Canta a plenos pulmões e se mostra agressiva. Aleixo anota a hora e o local em sua caderneta. Seguimos adiante.

Sob o sol suave da tarde, em um campo de árvores baixas, Aleixo ouve um canto especial. O som agudo lhe confere um momento singular de alegria. Não por sua beleza – não é propriamente a estética o que atrai a atenção de biólogos -, mas pela raridade. Em voz baixa, para não assustar o passarinho, ele comenta: “É uma espécie que só era conhecida no alto rio Negro. O Neopelma palessi. Era uma das aves mais raras da Amazônia, com uma das menores distribuições conhecida, candidata a ser ameaçada de extinção”, diz. “Agora tudo mudou.”

Compreender a composição dessa floresta primária é um desafio instigante para os biólogos. A vegetação varia conforme a quantidade de luz e a composição do solo – e, em cada uma dessas variantes, há uma fauna particular. Entre duas serras, nesse percurso, penetro em uma mata colossal, irrigada pela água que escorre dos morros em um solo fofo. A copa das árvores é tão alta que mal consigo enxergar o topo. O dossel é dominado pelo angelim, espécie gigantesca, ouro verde para a indústria madeireira. A poucos passos dali, ao subir um rochedo de solos pobres, a vegetação torna-se uma savana seco e áspero como no centro-oeste brasileiro. O chão rochoso é ácido e rico em bauxita.

A análise botânica indica que há muito mais áreas de campos e savanas antigos espalhados pela Amazônia do que se pensava, o que comprova a chamada “teoria de refúgios florestais” de que a floresta aumentou depois de um período prolongado de secas. Enquanto algumas partes de mata densa contêm cerca de 150 espécies de árvore, com copa como a do angelim, que ultrapassa os 60 metros de altura, em outras, mais áridas, há longos trechos em que foram encontradas menos de 40 espécies distintas em 1 hectare – e que, em média, sua copa não passa de 20 metros de altura. Há ainda, além desses vastos campos, um tipo de floresta que se assemelha a uma campina, um pouco mais úmido que a savana. As pesquisas ainda são embrionárias, e os cientistas a classificaram como uma “campinarana”, do mesmo modo que as matas em solo arenoso localizadas no distante alto rio Negro. Nesse tipo de ambiente, ao olhar o horizonte, distinguem-se árvores finas de uma mesma espécie lado a lado, onde uma luz suave filtrada pelas folhas faz lembrar um bosque europeu.

Nem tudo são flores, luzes e cantos na região. Garimpos pipocam no leste do mosaico, com maior concentração na Reserva Biológica Maicuru e na Floresta Estadual do Paru. Estima-se em mil pessoas a população garimpeira local. São homens com idade média de 42 anos, solteiros (48%), com um a três filhos – deixados em casa, para onde vão uma vez por ano. Dados do Imazon mostram que 40% dessa gente é natural do Maranhão e 31% do Pará. São migrantes pobres. Após o decreto que protege as áreas entrar em vigor, eles terão de abandonar a extração de ouro. A atividade passa a ser ilegal, assim como a exploração madeireira. E não há muitas opções a quem vive na margem norte do rio Amazonas.

É o caso de Louro, de 29 anos, natural de Monte Alegre, importante cidade da região, mateiro e ajudante de campo da equipe de botânica. Filho de um pequeno agricultor, até o início das expedições estava desempregado. “Para ganhar algum, às vezes vendemos madeira de nossa terra. Mas o Ibama fechou as serrarias”, lamenta.

Historicamente, o isolamento propiciou refúgios e esconderijos. Negros escravos que trabalhavam com cacau em cidades antigas, como Santarém e Óbidos, subiam o rio Trombetas para formar quilombos no século 19. Hoje há mais de 30 comunidades, por exemplo, no entorno da cidade de Oriximiná. Algumas, como Ariramba, estão em conflito com a Floresta Estadual de Faro. “Essas novas unidades de conservação envolvem parte do território tradicional, e eles não concordam”, explica a antropóloga Lúcia Andrade. O que perturba os quilombolas é que as florestas estaduais podem ter exploração econômica, e eles vão ter de discutir com todos os que vivem e exploram a mata – no caso, aguarda-se a chegada de madeireiras e mineradoras. Para usarem sua terra, os quilombolas agora terão de negociar com pessoas de fora da comunidade.

Cai uma chuva leve. Sigo a equipe de Hoogmoed em mais uma coleta. A chuva é bem-vinda aos herpetólogos, assim como aos ictiólogos – os calmos pescadores que coletam peixes silenciosos durante o dia em rios e pequenos igarapés.

Descemos das rochas e marchamos dentro de um igarapé. Ali não há latidos, mas outros coaxos mais melódicos. Nosso objetivo é seguir o som de microchips amarelos e pretos do tamanho de um dedão. São sapos Atelopus hoogmoedi. O animal, bem conhecido da equipe, foi batizado em homenagem ao biólogo que caminha comigo na água. “Nunca tinha visto tantos juntos”, diz Hoogmoed. “Há muito canto de machos. Deve ser um período de reprodução.”

O espanto de Hoogmoed é compartilhado com todos os cientistas ali. “Tenho certeza de que nunca um biólogo esteve aqui por onde estamos caminhando; tudo é praticamente desconhecido”, comenta. Foi assim que comemorou a coleta de uma rã de cor azul, aDendrobates tinctorius, que ele conhecia em suas pesquisas no sul da Guiana e no Suriname. Mas a distribuição era imprecisa no Brasil. “A pele dela contém um veneno que dá uma sensação desagradável quando entra na boca e nos olhos, mas não chega a ter efeito mortal nos homens”, alerta. Na mesma noite em que perseguiam a rã que latia, a Leptodactylus myersi, a equipe de Hoogmoed encontrou uma cobra vermelha endêmica dali, a Pseudoboa coronata. Pequena, é um belo animal com toda aparência de ser peçonhenta. “Ela faz parte de um grupo de espécies de cobra da Amazônia que usa o mesmo padrão de cor, um vermelho forte, para assustar predadores”, explica. “É só um disfarce, ela não é venenosa.”

Pisar num terreno que é um “vazio” para a ciência – sim, ainda existem áreas desconhecidas – fascina exploradores. Enquanto os biólogos espalham armadilhas, eu passo a revirar folhas nas margens de um igarapé. “Quem sabe descubro o menor sapo do mundo?”, pergunto a Hoogmoed. “Nada impede”, diz. Nessa busca, distingo um inseto no chão. Parece uma formiga, mas é um microssapo. Coleto e mostro ao biólogo, na esperança de um feito relevante. “Ele é muito pequeno”, diz ao examinar minha pretensa descoberta. “Mas é só um filhote de Bufo margaritifer. Vai crescer até uns 10 centímetros”, conclui ele.

Apesar de as novidades saltitarem cantantes pela floresta, foi uma estranha e discreta cobra-de-duas-cabeças o que mais surpreendeu Hoogmoed. “Encontramos uma nova espécie”, diz. O animal da família Amphisbaenidae, répteis parentes de lagarto, tem uma “cabeça” coniforme e um “rabo” que seria, diz ele, “bem diferenciado de outras espécies daquela família”. Após o espécime ser coletado, um minucioso processo de pesquisa é feito nos laboratórios por taxonomistas. Só então a espécie é considerada “nova”.

Muito além de relatórios para planos de manejo, o que move o ímpeto desses biólogos é a chance de descrever a fauna e a flora de um vazio científico – trabalho que ainda vai levar tempo nos laboratórios. Cada equipe de especialistas, seja de mamíferos, seja de aves ou répteis, deve descrever cerca de cinco espécies novas. Mas o principal, eles comemoram, são as informações inéditas que obtiveram da área. “Agora temos conhecimento mais completo da distribuição das espécies no norte amazônico”, explica o ornitólogo Aleixo. “O material coletado vai alimentar uma discussão de novas espécies e revisão taxonômica de grupos durante décadas.”

Igualmente surpreendente é a sensação de aterrissar na Terra Indígena Zo’é. Ela fica no centro geográfico do mosaico das unidades de conservação – e, por ser terra federal, ficou de fora das recentes pesquisas ecológicas. É um universo singular em que transparece a harmonia do ser humano com a floresta pouco conhecida pela ciência. Os índios zo’és foram contatados por uma missão religiosa americana, em 1987, que tinha o objetivo de evangelizá-los. Nos primeiros anos, 30% da tribo foi aniquilada por epidemias de gripe. A missão foi expulsa, e o povo recuperou-se demograficamente – hoje somam 246 pessoas. A terra indígena, originalmente com mais de 2 milhões de hectares, foi reduzida a cerca de 600 mil por um laudo da própria Funai, e ainda não foi homologada. Parte do território suprimido está localizada dentro do que se tornou a Estação Ecológica do Grão-Pará, rica em bauxita e reivindicada pela mineradora Rio Tinto. A exploração do minério poderia trazer impactos à vida dos zo’és ainda mais fortes que a frustrada experiência missionária. A bauxita espalha-se pela superfície e exige a supressão da cobertura vegetal para sua extração, assim como é necessária a construção de complexa malha logística. João Lobato, funcionário local da Funai, está preocupado: “Hoje, a única garantia à sobrevivência dos zo’és é preservar a floresta”.

Em uma das aldeias, a índia M’Bossoi, mãe adotiva de um jovem casal de gêmeos cuja mãe biológica morreu no parto, canta para mim músicas que me lembram um fado. Está em sua rede com os olhos mareados fitando o horizonte. As crianças, ao lado, escutam atentas. O ambiente é calmo. Eu não entendo o que ela diz. A expressão é melancólica – mas não deve cantar algo triste. Na poética voz de M’Bossoi, penso no destino desse paraíso. As ameaças podem estar distantes como a margem de um rio.

O avião decola, e o gigante campo de brócolis floresce novamente abaixo. Mas bastam 25 minutos para aparecer as primeiras clareiras na planície. A partir dali vejo quadrados pretos de queimadas cada vez maiores, agora cortados pela cicatriz de uma estrada. Quando avisto o rio Amazonas, já há núcleos urbanos e pequenas cidades. Dessa margem até a outra beira, em Santarém, o avião precisa dos mesmos 25 minutos que levou da aldeia zo’é até eu avistar os focos de devastação. A fronteira de mundos tão diferentes é como a calha de um rio. Como se a harmonia dos zo’és e desse ecossistema ainda incógnito para a ciência estivesse em uma margem. E na outra, justamente em frente, a fronteira colonizadora que avança sobre a água.

Publicado na Revista National Geographic  – Ed. 114

Written by Felipe Milanez

August 30, 2011 at 8:38 pm

ABOUT THE BIG BRAZILIAN GENOCIDE – TEDxAmazônia

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Written by Felipe Milanez

August 30, 2011 at 7:47 pm

PLOWBOYS AND INDIANS

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Brazilian Farmers are slaughtering native tribes for land.

BY FELIPE MILANEZ

            PHOTOS BY ARAQUEM ALCANTARA

Rita, an indigenous Piripkura Indian, speaks only rudimentary Portuguese, and I can’t understand her native language, Tupi-kawahib, any better than I can pronounce its name. But over the course of our first hour together, we pieced together the story of the massacre of her tribe. It started one night, some 30 years ago, when a group of men invaded their land brandishing pistols and wooden bats. The murderers, known as jagunços and hired by farmers eager for Piripkura land, chased down unsuspecting members of Rita’s tribe and shot or bludgeoned them to death. Her father was decapitated, as were dozens of children and seniors. Her aunt, asleep in a hammock, was shot point-blank and tossed into a large pile of burning bodies. Rita was raped. Maybe they just forgot to kill her. Surveying her village in the aftermath, she assumed she was her tribe’s only survivor.

As she told me her story, Rita and I were sitting face to face in a dilapidated wooden hudeep in Brazil’s Amazon forest. We were somewhere between the states of Mato Grosso and Amazonas, in the city of Colniza. The surrounding region is acknowledged as the most violent in the country, which, given Brazil’s surging homicide rate, makes it among the very worst of the worst. We also happened to be sitting on the plot of land where her friends and family were killed.

In Brazil, stories like Rita’s are routinely covered up or completely ignored. The truth is, similar acts of genocide have been carried out since the region was colonized during the military dictatorship in 1964. The root cause of the violence against Brazil’s indigenous people is nearly always that of encroaching timber interests—soulless and aggressive pricks eager to meet an ever-increasing market demand for raw lumber. Small, displaced groups of survivors like Rita, unable and unprepared to defend against arbitrary raids, are left to roam the jungle like ghosts.

More than a year after the attack, Rita was found wandering alone in the forest. Her discovery was the result of persistent search expeditions organized by FUNAI, the government agency established to protect indigenous people. Left without options, Rita was abruptly immersed in Brazilian society. She got the worst possible reception: In each passing city, she suffered physical abuse and bigotry and was eventually enslaved on a farm. She did house chores and was forced to provide sex services. She later ran away and married an Indian man from another small tribe, and today she lives a quiet tribal existence deep in the forest. Rita told me this in the same sweet manner she has told me things in the countless conversations I’ve had with her since: shy and reserved but with a polite, if untrusting, smile.

In the late 1990s, more than 20 years after the slaughter of Rita’s relatives, two fellow Piripkura tribesmen, Tucan and Monde-I, emerged from the jungle. It caused a minor and short-lived media stir. Tucan was in need of medical assistance. His attending nurse told me he was “pissing Coca-Cola” and needed his gall bladder removed. Monde-I got impatient or annoyed or bored—the two are renowned as the second and third coming of John Rambo—and headed back into the thicket while Tucan recuperated. Three months or so later, Tucan disappeared to rejoin Monde-I in the forest. So Rita was technically not alone, but today the Piripkura tribe still totals just three.

The eradication, in whole or in part, of indigenous tribes is certainly the goal for some farmers. Rita’s tribe was massacred because they happened to occupy land claimed by timbermen—and there are several other tribes that continue to suffer similar fates for similar reasons. Less than a thousand yards from the farm where I met Rita, I spent an afternoon with a Kanoe Indian family. Purá was happily teaching his seven-year-old nephew Bakwa to hunt with a bow and arrow, while his mother, Tiramantu, fastened a bracelet onto my wrist in silence. These three are all that remain of the Kanoe tribe after yet more unprovoked mass killings. They share a 150-square-mile stretch of land called Terra Indígena Omere with the Akuntsu clan, which today consists of just six people. Popak, one of the tribe’s four men, spoke quickly when we met. He also gave me a nasty face when I pointed to a scar on his back, explaining that he was shot during an attack on his tribe. Sometimes I forget that even as a nonmurderous fair-skinned Brazilian, I’m still the asshole.

Filmmaker Vincent Carelli, himself a nonmurderous fair-skinned Brazilian, spent 20 years investigating and documenting the massacre of the Akuntsu Indians, collecting evidence of the participation of local farmers (complete with damning testimonials from the timber-company workers who actually perpetrated the murder). His resulting movie, Corumbiara, premiered in São Paulo this March and is quite possibly the only beautiful thing involved with this story. Because certainly nothing has changed. In fact, things are worse. Since making his film, Carelli has actually witnessed the massacre of another group so remote that they were never assigned a name. It is widely accepted that attempts to oust the tribe were first made with arsenic-and-sugar cocktails. When that didn’t work, a pack of murderous jagunços took over. The sole survivor lives undisturbed, alone, in a hole in the jungle.

“No one was sent to jail—they weren’t even indicted. Not one of those bandits,” said Marcelo dos Santos, the man who first made contact with the tribe and organized a search for those responsible for killing them. Santos has suffered numerous threats and prefers not to identify the people he suspects are guilty. In nearby cities, the citizenry is not so tight-lipped: local high-profile influence peddlers Antenor Duarte, Antônio Vilela Junqueira, former senator Almir Lando, and the infamous Dalafini brothers are all suspected of involvement. As coincidence would have it, they own the farms nearest to where the unnamed tribe lived.

In Colniza, the violent city in northern Mato Grosso where I met Rita, I ran into a timberman, Julio Pinto. His father, Renato, and 70 of his associates spent some time in jail accused, variously, of either killing or ordering the killings of Piripkura Indians. True to form, Pinto and Co. were of the mind that the tribe was on their land. These were Rita’s relatives. All the suspects were ultimately set free, and Pinto told me with a straight face: “I never saw Indians in the region.” As in, How could anybody kill a person they’ve never even seen? (Hint: They order or pay someone to do it for them.) One of Pinto’s partners, Luiz Durski, also owns farms near Piripkura land. In an interview in São Paulo, he had assured me that the case against Renato was “madness” on behalf of the federal prosecutor, Mario Lucio Avelar. Practically as an afterthought, Durski remembered to say that he too has never seen an Indian.

Characterizing these crimes as genocide, convicting offenders, and determining sentences are the primary obstacles for authorities. Well, those and also fear and bribes and the matter of just not giving a shit. The legal system in the Amazon is a quagmire of local colonels wielding political influence. It’s nearly impossible to enforce laws that nobody really cares to have enforced in the first place. The principal offenders are loggers, miners, and farmers, and few outside that circle are willing to tackle some of Brazil’s most fruitful industries. Particularly not on behalf of a few ghosts hoofing around in the bush.

Published at Vice Magazine.

Written by Felipe Milanez

August 30, 2011 at 5:50 pm